Travamento de ação contra Ramagem pode ser inconstitucional e favorecer Bolsonaro, avaliam ministros do STF
Ministros consideram que benefício só se aplica a crimes cometidos após diplomação como deputado
Apesar da aprovação na Câmara dos Deputados para suspender o processo que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) contra Alexandre Ramagem (PL-RJ), o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete acusados por tentativa de golpe de Estado, ministros da Corte consideram inconstitucional a interrupção integral da ação penal. A avaliação majoritária é que a medida aprovada, por 315 votos favoráveis e 143 contrários, não impactará substancialmente o andamento do processo no STF.
Segundo ministros ouvidos pelo jornal O GLOBO, a Constituição Federal autoriza a suspensão apenas para Ramagem e exclusivamente em relação a crimes praticados após sua diplomação como deputado federal, ocorrida em dezembro de 2022. Portanto, não haveria efeito sobre as acusações anteriores nem benefício para Bolsonaro ou para os demais réus.
Crimes do 8 de janeiro podem ser afetados; tentativa de golpe, não
O benefício aprovado pela Câmara poderia alcançar apenas crimes relacionados aos atos de 8 de janeiro de 2023, como deterioração de patrimônio tombado e dano qualificado contra patrimônio da União, delitos ocorridos já no exercício do mandato.
No entanto, Alexandre Ramagem também foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por crimes como tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado e formação de organização criminosa armada — todos imputados a ele por fatos anteriores à diplomação. Para os ministros do STF, essas acusações não podem ser suspensas com base no artigo 53 da Constituição.
Zanin comunica à Câmara impossibilidade de trancamento integral
O ministro Cristiano Zanin, presidente da Primeira Turma do STF, já encaminhou ofício ao presidente da Câmara, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), reforçando que a ação penal contra Ramagem não poderá ser trancada em sua totalidade. No documento, Zanin esclarece que a suspensão pode ocorrer apenas em relação aos crimes cometidos após a diplomação, restringindo o alcance da decisão parlamentar.
Ainda segundo integrantes da Corte, a suspensão tampouco pode beneficiar Bolsonaro e os outros réus que não possuem mandato parlamentar, o que esvazia eventual tentativa de ampliar o escopo da decisão da Câmara.
Pedido de suspensão cita imunidade parlamentar
O requerimento para sustar o processo foi apresentado pelo PL em abril, logo após Ramagem e Bolsonaro se tornarem réus. Durante a votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Ramagem criticou o Supremo Tribunal Federal:
“É indiscutível que vivemos hoje uma hipertrofia de um Poder sobre o outro. Hoje, o STF trata os deputados como irrelevantes. Mais do que isso, no meu caso, parlamentar eleito, estou servindo de joguete do STF”, afirmou o deputado.
A defesa do parlamentar e do partido baseou o pedido no artigo 53 da Constituição, que trata da imunidade parlamentar. Conforme o dispositivo, ao receber denúncia contra um deputado ou senador, o STF deve comunicar a respectiva Casa Legislativa, que poderá deliberar sobre a suspensão da ação penal.
Sustação de Andamento de Ação Penal (SAP)
O instrumento formal utilizado foi a Sustação de Andamento de Ação Penal (SAP). Este mecanismo permite que a Câmara ou o Senado suspendam o andamento de uma ação penal contra parlamentares por crimes cometidos após a diplomação.
A defesa de Ramagem argumenta que, mesmo para os crimes apontados como anteriores, haveria “permanência” no tempo dos atos, o que, segundo eles, justificaria a aplicação da suspensão. Contudo, essa tese encontra forte resistência no STF, que interpreta a imunidade de forma restritiva, limitada a delitos efetivamente praticados durante o mandato.