Tornozeleiras eletrônicas monitoram mais de 24 mil presos no país
Equipamento permite controlar detento mesmo em prisão domiciliar.
Levantamento efetuado nestas quarta (19) e quinta-feira (20) pelo G1 – em consulta a todos os governos estaduais – mostra que pelo menos 24.203 presos são atualmente monitorados por meio de tornozeleira eletrônica e ao menos 821 aguardam a concessão de tornozeleira para deixar a prisão. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Brasil tem 622 mil presos.
De acordo com o levantamento, o estado onde há mais tornozeleiras eletrônicas disponíveis é Paraná (5,3 mil). Três estados (Amapá, Bahia e Roraima) e o Distrito Federal informaram não ter presos monitorados pelo equipamento.
Vários governos têm previsão de licitação para a aquisição de novas tornozeleiras. De acordo com informações de órgãos estaduais, o menor custo mensal por tornozeleira é o do Distrito Federal (R$ 161,92), que, embora não tenha presos monitorados, assinou em julho contrato para fornecimento de 6 mil tornozeleiras – o maior é o do Amazonas (R$ 475).
Rondônia e São Paulo foram os únicos que não responderam aos questionamentos do G1 (veja todas as respostas na tabela mais abaixo).
Em maio, a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) de São Paulo informou em nota que um novo contrato previa a entrega de 7.700 tornozeleiras, das quais 7 mil para serem usadas em todo o estado e 700 como reserva. O G1 questiona a SAP desde terça-feira sobre números atualizados e se o contrato já entrou em vigor, mas não obteve resposta até esta quinta-feira. A Secretaria da Segurança Pública (SSP) informou, em nota, que, para internos do Presídio da Polícia Civil, dispõe de 20 tornozeleiras. Segundo a SSP, esses equipamentos são disponibilizados exclusivamente em saídas temporárias ou em casos de liberdade condicional.
As tornozeleiras são opção da Justiça para que presos cumpram regime domiciliar e continuem sendo monitorados. Os equipamentos funcionam com um módulo GPS, como em carros, no qual são instalados um modem de celular, para transmissão de dados, com dois cartões de operadoras diferentes a fim de se evitar ausência de sinal.
De acordo com o professor Welliton Caixeta, da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB), que há sete anos pesquisa o uso de tornozeleiras, a tecnologia é importante alternativa pra diminuir o caos no sistema penitenciário. Segundo ele, um preso custa cerca de R$ 2 mil por mês em um presídio, e a tornozeleira, cerca de R$ 200.
“Diante, então, desse universo prisional hoje de aproximadamente 600 mil pessoas presas no país, 40%, que são os presos provisórios, poderiam estar sendo beneficiados com tornozeleiras eletrônicas (…) É uma alternativa ao caos”, afirmou.
Em janeiro, depois das chacinas de presos em estados do Norte e do Nordeste, o Ministério da Justiça anunciou o repasse de R$ 72 milhões aos estados para a compra de 10 mil tornozeleiras eletrônicas. Seis meses depois, o dinheiro ainda não foi liberado. O ministério informou que as ações do Plano Nacional de Segurança estão sendo revistas, por causa das trocas de ministros e dos cortes no orçamento.
Geddel e Rocha Loures
A escassez de tornozeleiras no país ganhou evidência após as prisões do ex-ministro Geddel Vieira Lima e do ex-deputado Rodrigo Rocha Loures.
Preso no último dia 3, Geddel está em Salvador desde a semana passada, depois de ter deixado o presídio da Papuda, em Brasília, para cumprir prisão domiciliar.
Sem o equipamento disponível na Bahia e no Distrito Federal, o desembargador Ney Bello, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), autorizou o ex-ministro a ir para prisão domiciliar mesmo sem tornozeleira.
Loures foi preso um mês antes de Geddel, em 3 de junho, depois de ter sido filmado pela Polícia Federal ao receber uma mala com R$ 500 mil, que seria dinheiro de propina. Loures passou à prisão domiciliar, mediante monitoramento, por decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Edson Fachin.
Sem o equipamento no Distrito Federal, a tornozeleira de Loures foi cedida pela Secretaria de Segurança Pública e de Administração Penitenciária de Goiás em 1º de julho. O Ministério Público apura se o ex-deputado foi privilegiado ao receber o equipamento em Goiânia.
PRESOS MONITORADOS POR TORNOZELEIRA ELETRÔNICA – Não se conseguiu informações de São Paulo e Rondonia.
Unidade da federação | Presos monitorados por tornozeleira | Presos à espera de tornozeleira | Previsão de licitação para compra? | Custo mensal |
Acre | 82 | 0 | Sim, com previsão de compra de 300 tornozeleiras | R$ 277,80 |
Alagoas | 788 | não informado | não informado | R$ 340 |
Amazonas | 728 | 0 | Sem previsão; contrato é de aluguel e está vigente | R$ 475 |
Amapá | 0 | 0 | Sim, à espera de recursos para comprar 500 tornozeleiras | não informado |
Bahia | 0 | 0 | Sim, há duas licitações, para 3.500 tornozeleiras | R$ 250,83 |
Ceará | 1586 | 0 | Sem previsão; contrato é de aluguel e está vigente | R$ 242 |
Distrito Federal | 0 | não informado | Contrato foi assinado em julho; 6000 tornozeleiras | R$ 161,92 |
Espírito Santo | 117 | 0 | Sem previsão; contrato é de aluguel e está vigente | R$ 210 |
Goiás | 920 | 25 | Sim; processo para compra de 5 mil novas tornozeleiras | R$ 283 |
Maranhão | 1572 | 0 | Sem previsão; há contrato vigente | R$ 252 |
Mato Grosso | 2857 | não informado | Sim, para alugar 6 mil tornozeleiras, ampliando contrato atual | R$ 255,76 |
Mato Grosso do Sul | 128 | 0 | Sim; previsão de compra de 2 mil | R$ 275 |
Minas Gerais | 1724 | 0 | Sim; previsão de compra de 5 mil | R$ 400 |
Pará | 1276 | 162 | Sim; para comprar 479 tornozeleiras | R$ 270 |
Paraíba | 143 | 0 | Sim, em andamento, para compra de 2000 tornozeleiras | R$ 265 |
Paraná | 5300 | 0 | Sem previsão; contrato é de aluguel e está vigente | R$ 245 |
Pernambuco | 2400 | 0 | Sem previsão; contrato é de aluguel e está vigente | R$ 232 |
Piauí | 300 | 73 | Nova licitação para compra de 3 mil tornozeleiras | R$ 275 |
Rio de Janeiro | 705 | não informado | não informado | R$ 252,19 |
Rio Grande do Norte | 535 | 0 | Sim; em andamento para compra de 600 tornozeleiras | R$ 275 |
Rio Grande do Sul | 2258 | 170 | Sem previsão; contrato é de aluguel e está vigente | R$ 260 |
Rondônia | não informado | não informado | não informado | não informado |
Roraima | 0 | 391 | Sim; processo para compra de tornozeleiras (número não informado) | R$ 192 |
Santa Catarina | 100 | 0 | Sim; processo para compra de 3 mil tornozeleiras | R$ 244 |
São Paulo | não informado | não informado | não informado | não informado |
Sergipe | 314 | 0 | Sem previsão; contrato é de aluguel e está vigente | R$ 340 |
Tocantins | 370 | 0 | Sim; previsão de comprar mais mil tornozeleiras (ainda sem prazo) | R$ 301,04 |
TOTAL | 24203 | 821 |
Projeção para 2018
De acordo com o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), em 2015 havia 18.172 pessoas usando tornozeleiras eletrônicas no Brasil (88% homens e 12% mulheres). A projeção do departamento é de que até 2018 haverá 35,7 mil pessoas monitoradas por ano, quase o dobro na comparação com 2015.
O Depen explica, em nota, que cabe ao Ministério da Justiça fomentar o uso das tornozeleiras “como alternativa à privação de liberdade”.
Segundo o órgão, é responsabilidade dos estados adquirir o equipamento por meio de licitações. Atualmente, além de firmar contratos para adquirir as tornozeleiras, os estados também são incumbidos de monitorar os presos que utilizam a tecnologia.
O departamento informou que 22 estados já firmaram convênios com empresas que fornecem as tornozeleiras.
Atualmente, além de responsáveis por firmar contratos para adquirir a tornozeleira, os estados também são incumbidos de monitorar os presos que utilizam a tecnologia.
Conforme o advogado criminalista Luís Henrique Machado, especializado em prisões preventivas, a falta de tornozeleira é corriqueira e não pode ser motivo para barrar a concessão de uma prisão domiciliar.
O monitoramento pode ser realizado sem o equipamento eletrônico, por meio de visitas periódicas.
“A Polícia Federal poderia fazer visitas periódicas ao endereço no qual é cumprida a domiciliar duas, três ou mais vezes por semana, apertar a campainha e verificar o cumprimento da decisão. Se constatar que a pessoa não está presente, dá margem para apontar que ela está descumprido a decisão”, explica o advogado.
O modelo de visitas da Polícia Federal sem aviso prévio foi adotado pelo juiz federal Gustavo Arruda Macedo no caso do empresário EikeBatista, que deixou Bangu 9 em abril passado.