SOBRE SAFRAS, JUROS E INFLAÇÃO – Por Vivaldo Lopes
Por Vivaldo Lopes
Envolto em questões de consistência e relevância questionáveis, o debate macroeconômico torna-se cada vez mais raquítico e inexpressivo no Brasil. Assim, perdemos boas janelas de oportunidade para discutir temas importantes para o salto qualitativo que o país tanto necessita para melhorar sua produtividade e seu progresso econômico.
Temas relevantes como a regulamentação para implantação de um novo sistema tributário e o amplo plano de financiamento e alavancagem da agropecuária passaram ao largo de debates mais aprofundados na semana passada. A pouca atenção dedicada a assuntos fundamentais para o futuro do país permitiram que poderosos grupos de interesses industriais conseguissem incluir no projeto de regulamentação da reforma tributária o aumento da taxação de veículos elétricos e a redução da tributação sobre armamentos e munições. Ambas as propostas caminham na contramão do que fazem as economias mais desenvolvidas. Esses países tributam fortemente armamentos e munições e atualizam suas legislações e políticas públicas para promover incentivos tributários à produção de veículos movidos a eletricidade, como forma de estimular a transição para uma nova matriz energética mais limpa e menos dependente do petróleo.
Em meio ao inócuo e pueril bate boca do presidente Luís Inácio contra a instituição Banco Central e seu presidente, o sobe desce do dólar, o país deixou passar quase despercebido outro assunto relevante para a política monetária, combate à inflação, balança de pagamentos e segurança alimentar. Na semana passada, o governo federal anunciou o Plano Safra 2024/2025, o maior da história.
A montanha de dinheiro chega a R$ 508 bilhões. São R$ 400 bilhões para financiar custeio, comercialização e investimentos para médios e grandes produtores rurais e agricultura familiar. Além dos recursos que serão ofertados pelos bancos públicos e privados, a juros subsidiados pelo Tesouro Nacional, o plano disponibiliza mais R$ 108 bilhões para a emissão de Letras de Crédito do Agronegócio (LCA) e Cédulas do Produto Rural (CPR).
A despeito de praticamente ignorar a oferta de assistência técnica aos pequenos produtores rurais e agricultura familiar, o plano agropecuário premia com juros menores, as práticas agrícolas sustentáveis, combate ao desmatamento, recuperação de áreas degradadas e a produção de alimentos com práticas orgânicas. Para compensar as perdas da safra de arroz do Rio Grande do Sul, o Plano Safra apresenta como alternativas a diversificação das áreas de cultivo e os contratos de opção de venda da produção de arroz ao governo.
Ao incentivar o aumento da produção nas grandes e médias propriedades ativa toda a longa cadeia do PIB agropecuário, aquecendo o mercado de trabalho e o consumo doméstico. Mais voltada à exportação a produção agropecuária industrial melhora a balança de pagamentos e auxilia no combate à inflação trazendo dólares para o país.
O incentivo ao agrofamiliar, que produz os alimentos que todos os brasileiros comem, como mandioca, arroz, feijão, frutas, hortaliças, é outra forma de enfrentar a inflação. Além da garantia alimentar, aumenta a oferta de alimentos e pressiona os preços para baixo.
Espera-se que a sintonia fina entre aumento da produção agropecuária, juros mais baixos, práticas sustentáveis resulte em redução dos preços e, por consequência, combate à inflação.
*Vivaldo Lopes, economista formado pela UFMT, onde lecionou na Faculdade de Economia. É pós-graduado em MBA- Gestão Financeira Empresarial pela FIA/USP ([email protected]).
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