O que acontece com a chapa Dilma/Temer após os depoimentos da Odebrecht?
O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) deu início nesta semana aos depoimentos de ex-executivos da Odebrecht na ação que pode levar à cassação do mandato do presidente Michel Temer.
Além de Marcelo Odebrecht, ex-presidente e dono da empreiteira, já foram ouvidos outros dois ex-executivos nesta quinta-feira (2), e outros dois depoimentos estão marcados para a próxima segunda-feira (6). Nesta quinta-feira, o ministro Herman Benjamin, relator do processo no TSE, autorizou os depoimentos de mais dois delatores da empreiteira, mas ainda não agendou os depoimentos.
Todos os sete fecharam acordos de delação premiada com a Operação Lava Jato, assim como outros 70 executivos e ex-executivos da empresa.
O ministro Benjamin poderá convocar nos próximos dias mais depoimentos de pessoas citadas pelos delatores da Odebrecht.
Quais os próximos passos da ação no TSE?
Os depoimentos dos delatores da Odebrecht podem ser os últimos a serem tomados pelo TSE. Isso porque o ministro Herman Benjamin deu sinais, nos últimos despachos feitos no processo, de que pretende dar rapidez ao desfecho do caso.
A ação, no entanto, não tem prazo para terminar. Alongar a fase de apuração pode ser uma estratégia dos advogados de defesa de Temer, que podem pedir para que novas testemunhas sejam ouvidas ou apresentar contestações ao andamento da ação.
Segundo reportagem do jornal “Folha de S.Paulo”, a defesa de Temer também estuda pedir a anulação dos depoimentos da Odebrecht.
Os advogados também podem apresentar manifestações com pedidos de esclarecimento ou contestação, de depoimentos ou documentos que forem incluídos na ação.
O TSE está julgando um pedido de cassação da chapa que reelegeu Dilma Rousseff e Michel Temer em 2014. O PSDB, partido adversário naquela eleição, moveu a ação acusando a campanha de Dilma de ter cometido abuso de poder econômico e político na campanha. Um dos pontos da acusação é o de que dinheiro do esquema de corrupção descoberto na Petrobras teria irrigado a campanha.
A ação foi movida logo após o resultado da eleição, mas o TSE só abriu o processo em outubro de 2015, após recurso do PSDB contra o arquivamento do pedido de cassação.
Um dos principais pontos investigados é a suspeita de irregularidades no pagamento a gráficas que atuaram na campanha de Dilma.
Como a presidente Dilma foi deposta do cargo num processo de impeachment, concluído em agosto do ano passado, a Justiça Eleitoral agora deve julgar se as supostas irregularidades apontadas na campanha podem cassar o mandato de Michel Temer, vice alçado ao comando do Palácio do Planalto com o impeachment.
Ao fim dos depoimentos no TSE, os advogados de Dilma, de Temer e do PSDB, assim como a Procuradoria-Geral da República, devem apresentar suas manifestações finais no processo.
Em seguida, o relator encerra a fase de investigação e prepara seu voto. O processo será julgado pelos sete ministros do TSE após o relator indicar ao presidente da corte, ministro Gilmar Mendes, que já tem seu voto pronto.
Esse tipo de ação deve ter o julgamento agendado para a sessão seguinte à data em que o relator liberar o processo para julgamento pelo plenário do TSE.
Depoimento pode cassar Temer?
Se forem comprovadas as afirmações já feitas por Marcelo Odebrecht em seu depoimento, são fortes as chances de Temer ter o mandato cassado, segundo professores de direito eleitoral ouvidos pela reportagem do UOL.
Segundo reportagem do jornal “O Estado de S.Paulo”, Marcelo teria afirmado que que 4/5 de um total de R$ 150 milhões (ou seja, R$ 120 milhões) destinados pelo grupo para a campanha da chapa Dilma/Temer em 2014 foram pagos por meio de caixa 2.
Caixa 2 é como são conhecidos os repasses às campanhas que não são declarados na prestação de contas oficial à Justiça Eleitoral. A prática é ilegal.
“O caixa dois é um dos elementos de abuso de poder econômico nas eleições”, afirma a professora de direito eleitoral da FGV (Fundação Getúlio Vargas) Silvana Batini.
“A se comprovarem esses fatos, são fatos que dificilmente poderão ser desconsiderados no contexto. É muito difícil você achar que um valor como esse não impacta uma eleição”, afirma a professora.
O advogado e professor de direito eleitoral do IDP (Instituto Brasiliense de Direito Público) Daniel Falcão afirma que a análise pelo TSE da gravidade da eventual irregularidade deve levar em conta também o volume dos recursos em comparação ao total arrecadado na campanha.
A prestação de contas da chapa de Dilma informou ter recebido pouco mais de R$ 350 milhões em doações oficiais. “Ou seja, é muito dinheiro dentro da campanha que seria de caixa 2”, afirma Falcão.
Tanto Falcão quanto Batini afirmam que mudanças recentes na legislação determinam que, para decidir sobre a cassação, a Justiça Eleitoral não considere apenas a questão do volume de recursos, mas avalie a gravidade do ato supostamente irregular.
“Independentemente do valor e do impacto no resultado nas eleições, é grave porque estava se tratando de uma chapa de reeleição, que tinha poder de barganha com a própria empreiteira. Então é grave objetivamente falando”, afirma Batini.
Os dois professores afirmam que a avaliação sobre as supostas declarações de Marcelo Odebrecht foi feita em tese, baseada na hipótese de que o depoimento dele seja confirmado.
O conteúdo do depoimento de Marcelo Odebrecht está sob sigilo. A versão oficial só será divulgada pelo TSE após o STF (Supremo Tribunal Federal) liberar o conteúdo das 77 delações de ex-executivos da Odebrecht, homologadas pela Justiça em janeiro. A ação em curso no TSE foi aberta a pedido do PSDB contra a chapa Dilma/Temer. A ação pode levar à perda de mandato do presidente Michel Temer (PMDB).
TSE pode inocentar o vice?
Um dos argumentos utilizados pela defesa de Temer no TSE é que, como vice-presidente, ele não teria responsabilidade sobre supostas irregularidades praticadas pela equipe de campanha de Dilma.
Em seu depoimento, segundo reportagem do jornal “Folha de S.Paulo”, Marcelo Odebrecht teria afirmado que recebeu um pedido de doação de Temer, em jantar na residência oficial do então vice-presidente, mas que no encontro não foram acertados valores.
Falcão e Batini afirmam que a jurisprudência do TSE, ou seja, as decisões em julgamentos anteriores, em sua maioria proíbe a separação da chapa na hora de aplicar a pena de cassação. Ou seja, se o presidente for condenado, o vice vai junto.
“O candidato a vice e o candidato a presidente, ambos se beneficiaram dessa irregularidade”, diz Falcão. “É aquela ideia que muitos na época do impeachment falavam: quando você votou na Dilma, também votou no Temer. Se é chapa é para tudo, os ônus e os bônus”, diz o professor do IDP.
Para Silvana Batini, a pena de cassação deve ser aplicada aos dois integrantes da chapa (presidente e vice), pois ambos são beneficiados por eventuais irregularidades na campanha.
“Dividir a chapa já é um absurdo. Agora, nesse caso, se esse valor foi negociado pelo próprio vice da chapa, isso afasta qualquer invocação [do argumento da defesa]”, diz a professora da FGV.
O que dizem Dilma e Temer?
As defesas de Dilma Rousseff e Michel Temer têm negado a existência de qualquer prática irregular na campanha de 2014.
Em nota divulgada por sua assessoria de imprensa, a ex-presidente Dilma Rousseff afirmou que as declarações de Marcelo Odebrecht são “mentirosas”.
Temer afirmou, por meio de nota enviada pelo Palácio do Planalto ao “Estado de S.Paulo”, que todas as doações da Odebrecht ao PMDB foram declaradas à Justiça Eleitoral, e que o presidente não negociou valores com Marcelo.
Por Felipe Amorim – Do UOL, em Brasília