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Ex Senador está preso no mesmo local onde cumpre pena o sequestrador de sua filha

A Subsecretaria do Sistema Penitenciário transfere o ex-senador para a solitária após uma vistoria encontrar café, chocolate e massa importada na cela ocupada por ele na Papuda.

As regalias concedidas ao empresário e ex-senador Luiz Estevão derrubaram a direção do Centro de Detenção Provisória (CDP), no Complexo Penitenciário da Papuda. Além disso, agentes de atividades penitenciárias são suspeitos de receber propina para permitir a entrada de produtos proibidos no local onde está o detento. A fraude foi descoberta após uma vistoria da Subsecretaria do Sistema Penitenciário (Sesipe), em 26 de janeiro, que encontrou chocolate, cápsulas de café, cafeteira elétrica e massa de macarrão importada na cela do ex-parlamentar, transferido para a solitária por 10 dias. Os servidores também identificaram alimentos e objetos não permitidos na cantina frequentada por ele. Agora, a Secretaria de Segurança Pública e da Paz Social, o Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) e a Polícia Civil investigam quem facilitou a entrada dos itens.

A Sesipe instaurou na segunda-feira sindicância administrativa para apurar o caso. Além disso, pediu a exoneração de todos os integrantes da cúpula do CDP, inclusive do diretor da unidade, Diogo Ernesto de Jesus, agente de atividades penitenciárias. O CDP é o local onde ficam presos provisórios, sendo, ainda, o presídio de entrada e de classificação para as demais unidades do sistema penitenciário. Com capacidade para 1.646 detentos, está superlotada. Hoje, há 4.033 internos no CDP. Nos bastidores, circula a informação de que quem assumirá a direção do centro é o gestor da Penitenciária 1 do DF, delegado Johnson Kennedy Monteiro. Ele assumiu a direção após a fuga de 10 presos perigosos em fevereiro de 2016.
O ato para o afastamento dos servidores está sendo finalizado para ser publicado no Diário Oficial do Distrito Federal. A expectativa é que a perda dos cargos de chefia ocorra hoje. Um inquérito sigiloso também foi aberto na Divisão Especial de Repressão ao Crime Organizado (Deco) e no MPDFT.
Os privilégios de Luiz Estevão foram descobertos após denúncia ao Tribunal de Justiça do DF e Territórios (TJDFT) durante o recesso de fim de ano do Judiciário. Segundo consta nos autos do processo, o diretor adjunto do CDP, Vitor Espíndola, teria ido ao presídio em um sábado, fora do horário de expediente, na companhia do presidente do Sindicato dos Agentes de Atividades Penitenciárias (Sindpen-DF), Leandro Allan Vieira, e permanecido na cela do ex-senador por mais de uma hora.
Para a juíza da Vara de Execuções Penais (VEP), Leila Cury, “desde então, o mesmo (Luiz Estevão) estaria sendo privilegiado em relação ao recebimento de alimentos diferenciados, além de outros ainda em investigação, havendo indícios de prática de crimes envolvendo referidas pessoas e outros agentes lotados na mesma Casa Penal.”  Após a volta do recesso, a magistrada encaminhou um ofício sobre o caso à Sesipe e ao MPDFT para que apurassem o caso.

Isolamento

Desde que os benefícios proibidos foram descobertos, Estevão foi transferido da Ala B para uma solitária na Ala C, ambas do Bloco 5 do CDP. Segundo a Justiça do DF, ele desrespeitou normas do sistema e desacatou o coordenador-geral da Sesipe, Guilherme Nogueira, ao ser questionado sobre a presença de itens na cela. Como punição, seguiu para o Pavilhão Disciplinar, uma espécie de isolamento preventivo, como é feito com qualquer interno que descumpre ordens no sistema penitenciário brasiliense.
Estevão está agora no mesmo setor de Osmarinho Cardoso da Silva Filho. Ex-tenente da Polícia Militar, ele cumpre pena por ter sequestrado a filha do ex-senador, em setembro de 1997. Advogados do empresário entraram com um pedido, em 26 de janeiro, requerendo o retorno do detento ao local de origem, mas o Judiciário negou no dia seguinte. Na decisão, a juíza Leila esclareceu que “tal providência (cumprimento de medida disciplinar) não se mostra adequada nos estabelecimentos que possuam alojamento coletivo, como se observa no presente caso, tendo em vista que ele dividia a cela com outro apenado.”
Estevão tinha a companhia de dois condenados pelo mensalão, Ramon Rollerbach e Henrique Pizzolato. Este último, Lúcio Funaro, preso na Operação Lava-Jato, e Adriano Oliveira, ex-servidor do TJDFT, também foram transferidos para a solitária por regalias no CDP.
A magistrada ressalta, ainda, que “a alocação do interno faltoso em cela diversa visa contribuir para a melhor averiguação dos fatos, na medida em que os mesmos ocorreram justamente na cela em que ele anteriormente ocupava.” No entanto, o Judiciário determinou que cabe à Sesipe zelar pela integridade física dos dois internos (Estevão e Osmarinho), para evitar qualquer contato entre eles. Este é o segundo incidente envolvendo o ex-senador na Papuda (veja Memória). O advogado dele, Marcelo Bessa, disse ao Correio que só dará explicações à Justiça.

Agentes

Em nota, o Sindicato dos Agentes de Atividades Penitenciárias (Sindpen-DF) defendeu que as denúncias sobre a existência de uma suposta organização criminosa no âmbito da administração do CDP, imputando a agentes de atividades penitenciárias crimes de prevaricação, por exemplo, são caluniosas e inverídicas. O presidente da entidade, Leandro Allan Vieira, alegou que, em agosto de 2016, a direção do CDP soube dos privilégios de Luiz Estevão e os comunicou à Sesipe e à Gerência de Inteligência.
Também em nota, o Sindpen-DF negou que Leandro tenha visitado a cela de Luiz Estevão em um sábado, “uma vez que suas condutas, no desenvolvimento de suas atividades, quer sejam sindicais ou administrativas, sempre se pautaram pela legalidade e em obediência estrita e restrita às normas administrativas prisionais.”
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública e da Paz Social, órgão ao qual a Sesipe faz parte, esclareceu que a Sesipe instaurou uma sindicância, publicada no Diário Oficial do DF na segunda-feira, e comunicou o caso à Polícia Civil, que abriu inquérito para investigar a possível participação de agentes públicos. “A SSP-DF informa, ainda, que os servidores envolvidos serão afastados dos cargos que ocupam no CDP. Cabe frisar que todas as providencias adotadas estão sendo acompanhadas pelo Ministério Público e pela Vara de Execuções Penais”, acrescentou.

Patrimônio bilionário

Preso em uma solitária da Papuda, Luiz Estevão é apontado como o homem mais rico do Distrito Federal e um dos mais abonados do país. Ele já declarou ter patrimônio de US$ 12 bilhões. A riqueza do ex-senador nunca foi tratada com discrição: antes de ser detido, ele circulava pela cidade em uma Ferrari e dava festas nababescas em sua mansão, no Lago Sul. Estevão também é o maior proprietário de terras no DF, dono do portal de notícias Metrópoles e comanda o time Brasiliense.

Crime

Osmarinho foi condenado a 22 anos de prisão pelo sequestro de Cleucy Meirelles. À época, a vítima tinha 12 anos e chegava à Escola Americana. Por uma semana, ela ficou sob o poder de sequestradores. A polícia desvendou o crime depois que Osmarinho ligou para Estevão de um orelhão na 115 Sul. Foram 58 minutos de conversa, tempo para que a polícia rastreasse a ligação e o prendesse. No carro de Osmarinho, havia o contrato de locação do imóvel que serviu como cativeiro.
Três perguntas para
Anderson Espíndola, subsecretário do Sistema Penitenciário do DF 
De que forma o isolamento de Luiz Estevão pode interferir na pena dele?
Somente a Vara de Execuções Penais poderá responder essa questão. O nosso procedimento foi apenas fazer o isolamento preventivo do interno por ter cometido uma falta disciplinar, procedimento normal para qualquer custodiado que infrinja as normas disciplinares.
Quais servidores estão sendo investigados e por quais crimes?
Ainda é cedo para afirmar quem são os investigados, tampouco a responsabilidade de cada um no processo.
O que vai acontecer com Luiz Estevão?
Ele permanecerá isolado por 10 dias, continuando a cumprir a pena a que foi condenado.

 

Por  Isa Stacciarini do Correio Braziliense