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Entenda o “maior caso de suborno da história”

Informações divulgadas nesta quarta-feira (21/12) pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos revelaram que a empreiteira brasileira Odebrecht foi responsável pelo “maior caso de suborno da história”.

Após acordo de cooperação com a Justiça, a Odebrecht, a maior construtora da América Latina, e a Braskem, uma de suas subsidiárias que atua no setor petroquímico, admitiram ter pago, juntas, mais de 1 bilhão de dólares (o equivalente a 3,3 bilhões de reais), em propina  a funcionários, partidos políticos e representantes de governos de 12 países, incluindo o Brasil. Em troca do suborno, as empresas ganhavam vantagens em contratos em relação a concorrentes.

As conclusões são resultado de uma força-tarefa envolvendo investigadores do Ministério Público Federal (MPF) do Brasil, do Departamento de Justiça dos Estados Unidos e da Procuradoria-Geral da Suíça.

O esquema de pagamento de propina começou em 2001, ainda durante o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Desde então, a Odebrecht gastou cerca de 788 milhões de dólares em propinas. Já a Braskem admitiu ter desembolsado 250 milhões de dólares no período entre 2006 e 2014.

Como funcionava o esquema de corrupção?

Para gerenciar os pagamentos de propina, a Odebrecht contava com uma complexa rede de empresas fantasmas e contas bancárias espalhadas em diversas partes do mundo.

Segundo as investigações, o esquema era tão organizado que a Odebrecht criou, em 2006, um departamento exclusivo para gerenciar o pagamento de propina, chamado de “Divisão de Operações Estruturadas”.  De acordo com a Justiça americana, esta unidade era usada para pagar sistematicamente funcionários de governos, políticos e partidos.

Para ocultar os desvios, a “Divisão de Operações Estruturadas” usava um sistema de comunicações à parte, bastante seguro, que permitia aos membros do departamento comunicarem-se uns com os outros e com operadores financeiros externos por meio de e-mails e mensagens instantâneas, usando código e senhas.

Que países estavam envolvidos?

O esquema de corrupção envolveu políticos, partidos, empresários e funcionários do governo de 12 países: Brasil, Angola, Argentina, Colômbia, República Dominicana, Equador, Guatemala, México, Moçambique, Panamá, Peru e Venezuela.

Quanto cada país recebeu?

Brasil

Segundo o relatório, a Odebrecht e a Braskem pagaram, juntas, 599 milhões de dólares em propina a políticos, partidos e agentes do governo brasileiro em troca de vantagens em obras no país.

De acordo com as investigações da Justiça americana, os subornos foram pagos entre os anos de 2003 e 2016. A Odebrecht desembolsou 349 milhões em propina e, como resultado, garantiu ganhos em contratos de quase 2 bilhões de dólares. Já a Braskem autorizou o pagamento de 250 milhões em subornos durante o período.

Angola

Na Angola, a empreiteira desembolsou 50 milhões em propinas a funcionários do governo entre 2006 e 2013, em troca de participação em obras públicas. Os pagamentos levaram a ganhos de 261,7 milhões de dólares à Odebrecht.

Argentina

A empreiteira brasileira fez pagamentos ilícitos no valor total de 35 milhões de dólares a intermediários ligados a ao menos três projetos de infraestrutura na Argentina. Segundo a Justiça americana, os subornos aconteceram entre os anos de 2007 e 2014 e geraram ganhos em contratos de 278 milhões de dólares no país.

Colômbia

De 2009 a 2014, a Odebrecht gastou cerca de 11 milhões de dólares com intermediários na Colômbia. Esta propina garantiu à empreiteira ganhos de 50 milhões de dólares em contratos firmados com o governo colombiano.

República Dominicana

Na República Dominicana os subornos foram praticados ao longo de 13 anos, de 2001 a 2014. Durante o período, a Odebrecht gastou 92 milhões de dólares, destinados a intermediários que ajudaram a garantir ganhos de 163 milhões de dólares em obras no país.

Equador

No Equador, os subornos foram pagos ao longo de quase dez anos, entre 2007 e 2016. No total, a Odebrecht desembolsou 33,5 milhões de dólares e obteve, em troca, benefícios que somaram mais de 116 milhões de dólares.

Guatemala

Para garantir a participação em diversas licitações na Guatemala, a Odebrecht gastou cerca de 18 milhões de dólares com propinas no país. Os pagamentos foram realizados entre os anos de 2013 e 2015. Segundo as investigações, os ganhos da empreiteira ultrapassam 34 milhões de dólares no país.

México

Entre 2010 e 2014, a empreiteira brasileira pagou um total de 10,5 milhões de dólares a intermediários no México. As propinas pagas aos mexicanos garantiram à Odebrecht ganhos estimados em 39 milhões de dólares.

Moçambique

Em Moçambique, a Odebrecht pagou cerca de 900 mil dólares a funcionários do governo entre os anos de 2011 a 2014. Um dos pagamentos destinou 250 mil dólares a uma autoridade moçambicana que conseguiu convencer o governo a mudar de ideia e tocar um projeto na área de construção civil, que até então não seria aprovado pelas autoridades locais.

Panamá

A fim de manter e conquistar novos contratos com o governo do Panamá, a Odebrecht pagou 59 milhões de dólares em subornos. As propinas garantiram ganhos de mais de 175 milhões de dólares à empreiteira brasileira.

Segundo o relatório, um dos pagamentos foi destinado a dois parentes de um funcionário do governo panamenho, no valor de seis milhões de dólares. Em troca, eles garantiram a participação da Odebrecht em projetos públicos de infraestrutura.

Peru

A Odebrecht desembolsou cerca de 29 milhões de dólares com pagamento de propinas no Peru entre 2005 e 2014. De acordo com as investigações, o foco da atuação da empreiteira no país também era a obtenção de licitações. Os desvios praticados no Peru renderam à Odebrecht ganhos de 143 milhões de dólares.

A investigação da Justiça americana menciona, por exemplo, o caso de um funcionário do alto escalão do governo peruano que, em 2005, ofereceu apoio à Odebrecht em negociações sobre um projeto estatal fr infraestrutura, em troca do pagamento de 20 milhões de dólares. O valor foi pago, em parcelas, durante três anos. Para dificultar o rastreamento, as quantias foram destinadas a diferentes empresas – todas ligadas ao funcionário peruano.

Venezuela

Segundo o relatório apresentado pela Justiça americana, a Venezuela foi o país que mais recebeu propina da Odebrecht (sem contar com o Brasil), com pagamentos que somaram 98 milhões de dólares entre 2006 e 2015. O objetivo principal da empreiteira era garantir participação em obras públicas do país. Os subornos aconteciam via intermediários que cobravam propina em troca de facilitações de negócios da Odebrecht na Venezuela.

Marcelo Odebrecht Com a delação premiada, o ex-presidente da empreiteira Marcelo Odebrecht pode ser solto no final de 2017

Como o esquema foi descoberto?

As informações em detalhes sobre o esquema de corrupção protagonizado pela Odebrecht vieram à tona após a empreiteira e a Braskem terem firmado acordo de leniência  com autoridades do Brasil, dos Estados Unidos e da Suíça. Um acordo de leniência é similar ao de delação premiada, em que o acusado tem pena reduzida em troca de informações que ajudem nas investigações, só que para empresas.

A Odebrecht já estava sob o radar da Justiça. Nos últimos anos, a empreiteira vem sendo investigada pela força-tarefa da Operação Lava  Jato, responsável por apurar megadesvios de dinheiro ocorridos na Petrobras.

Em março deste ano, o ex-presidente da empreiteira Marcelo Odebrecht foi condenado pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa envolvendo negócios com a estatal.

Inicialmente, a pena de Marcelo Odebrecht era de 19 anos e quatro meses de prisão, mas ele pode ser solto já no final do ano que vem já que firmou um acordo de delação premiada com o MPF. O empresário está preso desde junho de 2015.

Por que EUA e Suíça participaram das investigações?

Embora a Odebrecht e a Braskem não tenham pago propina a intermediários nestes  países, as empresas praticaram atos ilícitos em solos americano e suíço.

Segundo as investigações internacionais, as duas empresas usaram, por exemplo, contas na Suíça e nos Estados Unidos para fazer os pagamentos de suborno. Outro exemplo: algumas das empresas fantasmas, usadas para lavagem de dinheiro, eram operadas por empresários em solo americano.

Além disso, a petroquímica Braskem, que tem ações na Bolsa de Valores de Nova York, também é acusada de violar regras do mercado de capitais. A Odebrecht, por sua vez, acumula na lista mais uma acusação: a de infringir a lei anticorrupção dos Estados Unidos.

Tais fatos permitem que as empresas brasileiras também sejam julgadas pelas leis suíças e americanas.

O que acontecerá com a Odebrecht e a Braskem?

As duas empresas foram condenadas a pagar uma multa de até 3,5 bilhões de dólares – o maior valor aplicado a uma companhia na história. Ao pagar esse valor, as empresas se livram das ações judiciais nos três países em que estão sendo investigadas.

As empresas vão pagar tudo isso?

Não sabemos ainda. A Odebrecht teria de pagar 4,5 bilhões de dólares, mas afirmou que só tem condições de pagar, no máximo, 2,6 bilhões. A Braskem deve pagar 957 milhões de dólares da multa. As autoridades internacionais vão analisar as contas da empreiteira antes de decidir o valor final. A decisão deve ser anunciada em 17 de abril de 2017.

Para onde vai o dinheiro da multa?

Independente do valor total pago, o acordo determina que a Odebrecht repassará 80% do valor ao Brasil, enquanto Estados Unidos e Suíça ficam com 10% cada um. Já no caso da Braskem, 70% da multa será paga para o Brasil, e os restantes 30% divididos igualmente entre Estados Unidos e Suíça. Os valores serão pagos em parcelas ao longo de 23 anos.

O dinheiro da multa será destinado a ressarcir as vítimas da corrupção, que são a União, os estados, municípios e empresas prejudicadas pelo esquema de corrupção, como a Petrobras.

Não para por aí

No final de novembro deste ano, dezenas de ex-funcionários da Odebrecht concordaram em assinar acordos de delação premiada. Espera-se que, agora, eles ajudem a revelar detalhes do esquema de corrupção em relação a políticos brasileiros. Os depoimentos só deverão ser enviados ao Supremo Tribunal Federal no início de 2017.

Fonte: DW Brasil