Em 3 passos: O que falta para a Câmara decidir se cassa o mandato de Cunha
Oito meses após a apresentação da denúncia, o Conselho de Ética da Câmara deve finalmente decidir nesta terça qual punição recomendará que seja aplicada ao deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ), acusado de ter mentido à CPI da Petrobras ao negar possuir milhões de dólares depositados no exterior.
No limite, o colegiado pode sugerir a cassação do mandato do peemedebista – a decisão final, porém, caberá ao plenário da Casa.
O desfecho está em aberto dentro do órgão: os 21 votos estão divididos entre aprovar o parecer do relator Marcos Rogério (DEM-RO), que pede a cassação, ou a pena alternativa proposta por João Carlos Bacelar (PR-BA), que sugere apenas a suspensão do mandato por três meses.
A segunda opção não teria efeito prático, pois Cunha já está afastado da presidência da Câmara e do exercício do mandato por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).
Seja qual for a decisão, a expectativa é que a questão ainda passe pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) antes de ser apreciada pelo plenário. Entenda as etapas que faltam para a decisão final:
1) Conselho de Ética
A representação contra Cunha foi apresentada em outubro por Rede e PSOL, que o acusam de ter mentido à CPI da Petrobras quando disse que não tinha contas no exterior – revelou-se depois que o parlamentar possuía milhões de dólares na Suíça.
Pelo Código de Ética da Câmara, um deputado omitir informação relevante de seus pares pode justificar a perda de mandato – Cunha sustenta que os recursos são geridos por trusts e que é apenas beneficiário do dinheiro.
As denúncias sobre recebimento de propina – o peemedebista é réu no STF sob a acusação de receber valores referentes a um contrato de navios-sonda da Petrobras – ficaram de fora da análise do conselho por decisão do presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA).
O placar no Conselho de Ética está bastante dividido. O voto da deputada Tia Eron (PRB-BA), simpática a Cunha, é considerado decisivo.
Ela entrou no órgão em abril, no lugar de Fausto Pinato, deputado paulista que deixou a cadeira após mudar do PRB para o PP. A troca teria sido uma escolha do presidente do PRB, o ministro Marcos Pereira (Indústria e Comércio), justamente para evitar a cassação de Cunha.
Se Tia Eron votar apenas pela suspensão do mandato, a expectativa é que a punição mais branda seja aprovada por 11 votos a 9.
Mas se ela apoiar a cassação, o resultado ficará empatado e caberá ao presidente do conselho, José Carlos Araújo (PR-BA), dar o voto de minerva. Já é sabido que ele votaria para que Cunha perca o mandato.
A decisão do conselho estava prevista para a última quarta, mas foi adiada por Araújo como um modo de tentar evitar a aprovação da pena mais leve. “Se votássemos, íamos perder”, reconheceu o deputado Júlio Delgado (PSB-MG), que defende a cassação.
Sua expectativa é que as notícias negativas para Cunha na última semana – o juiz Sergio Moro tornou sua mulher, Cláudia Cruz, ré em uma ação sobre as contas na Suíça – contribuam para influenciar o voto de Tia Eron.
Já os aliados de Cunha estão confiantes de que terão os votos suficientes para aprovar apenas a suspensão do mandato.
“Virou uma palhaçada. Esse presidente do Conselho de Ética falava que nós estávamos protelando, e na hora fica cassando número (de votos) para ganhar, fazer o palanque político dele”, criticou Washington Reis (PMDB-RJ).
“Acho que o Eduardo (Cunha) já teve uma condenação prévia muito pesada, que é o afastamento do seu mandato e da presidência (da Câmara)”, acrescentou, em referência à decisão do STF.
2) Comissão de Constituição e Justiça
Após a decisão do Conselho de Ética, o embate será na Comissão de Constituição e Justiça – a principal da Câmara, composta por 66 deputados.
Pelo trâmite usual de processos contra parlamentares, mesmo que o relatório pela cassação não seja aprovado no conselho, ele poderia ser submetido ao plenário da Casa. No entanto, aliados de Cunha trabalham na CCJ para mudar isso.
A manobra começou pelas mãos de Maranhão, que preside a Casa desde o afastamento do peemedebista. Ele fez uma consulta à comissão sobre como o plenário deveria analisar a decisão do Conselho de Ética.
O deputado Arthur Lira (PP-AL), outro aliado de Cunha, foi designado para responder as perguntas – e emitiu um parecer cujas respostas são todas favoráveis ao peemedebista.
Lira defende que, caso a pena mais branda a Cunha seja rejeitada no plenário, a proposta de pena mais dura (a cassação) não poderá ser colocada em votação em seguida.
Parlamentares favoráveis à perda do mandato têm adotado como estratégia evitar que a CCJ analise o tema antes da decisão do conselho – eles pretendem pedir vistas e adiar para a semana que vem a votação, também prevista também para a tarde desta terça, do parecer de Lira.
Se a cassação for aprovada pelo Conselho de Ética, a expectativa é que Cunha recorra à CCJ questionando a lisura do processo. Apesar de seu caso já ser o mais logo de toda a história do órgão, ele argumenta que seu direito à defesa não foi respeitado e, por isso, a tramitação deveria ser anulada.
3) Plenário
Caso a CCJ decida a favor de Cunha, seus opositores devem apresentar recurso diretamente ao plenário da Câmara para tentar colocar em votação o relatório pela cassação.
São necessários 257 votos (maioria simples) para aprovar a perda de mandato. Como a votação é aberta, opositores do peemedebista confiam na pressão da sociedade para cassar o deputado.
“Vamos recorrer para derrubar a consulta (à CCJ), pois o plenário tem que ser soberano para decidir”, disse Delgado.
Ele criticou a lentidão do processo – o que, na sua avaliação, acaba empurrando a decisão para o STF.
Na semana passada, veio a público que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu ao Supremo a prisão de Cunha. Segundo o jornal Folha de S.Paulo, a justificativa é que, mesmo afastado, ele continua agindo para atrapalhar os trabalhos do Conselho de Ética.
“Amanhã o Supremo toma uma atitude mais radical ainda, aí o pessoal fala que tem interferência de outro poder. Lógico que tem, o nosso poder não toma as atitudes que têm que tomar”, criticou Delgado.