Desembargador, jornalistas e cerca de 80 foram grampeados em esquema de espionagem em MT
Desembargador do TJMT, deputada, vereador, advogados, médicos, servidores e assessores parlamentares foram alvos de interceptações clandestinas.
Cerca de 80 números de telefone foram grampeados pelo núcleo de inteligência da Polícia Militar de Mato Grosso, em um esquema ilegal de espionagem, que foi revelado nesse domingo (14) em uma reportagem do Fantástico. As interceptações clandestinas teriam ocorrido entre outubro de 2014 e agosto de 2015 e tiveram entre os alvos o desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) José Ferreira Leite, a deputada estadual Janaína Riva (PMDB), e o vereador Vinícius Hugueney (PP), que atualmente comanda a Secretaria de Trabalho e Desenvolvimento Econômico de Cuiabá.
Foi com surpresa que José Ferreira Leite soube pelo G1 que o telefone dele havia sido grampeado e disse que não tem ideia do motivo da interceptação.
“Não faço a menor ideia. Não tenho nenhuma relação com o atual governo e nem com adversários do governo. Até fico surpreso em saber”, declarou.
Os telefones deles foram grampeados dentro de uma investigação sobre tráfico de drogas no estado, com o qual não tinham nenhuma relação.
Janaína Riva, que soube do caso pela equipe Fantástico, informou que vai propor a criação de uma CPI da Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT), na sessão de terça-feira (16), para investigar a suspeita de “arapongagem” no âmbito do governo do estado. Em nota, disse que ainda pedirá investigação criminal à Procuradoria Geral da República (PGR) e ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
“Pedro Taques, na qualidade de comandante máximo da Polícia Militar, não pode fugir à responsabilidade, que é sua, pela ocorrência desses lamentáveis episódios”, declarou, se referindo ao governador de Mato Grosso, Pedro Taques (PSDB). No relatório da PM, ela tem o apelido de “Janair”.
Também tiveram os telefones grampeados advogados, policiais, servidores públicos, jornalistas, médicos, assessores parlamentares, empresários, entre outros.
O G1 tentou entrar em contato com Vinicius Hugueney, mas ele não atendeu as ligações até a publicação desta reportagem.
Jornalistas grampeados
Os números de telefone dos jornalistas Larissa Malheiros Batista e José Marcondes, o Muvuca, também foram interceptados. Procurada pelo G1, Larissa confirmou os dados pessoais dela que constam na lista de números grampeados, mas disse que, por enquanto, não irá comentar sobre o assunto.
Atualmente, Larissa Malheiros trabalha na assessoria de imprensa da Polícia Militar de Mato Grosso. No entanto, na época em que teve o telefone interceptado, como consta nos documentos, atuava na Prefeitura de Várzea Grande, região metropolitana de Cuiabá. Ela também coordenou a equipe de comunicação da campanha a prefeito de Várzea Grande, Tião da Zaeli (PSD), em 2012.
Em 2015, ela trabalhou dois meses no Departamento de Água e Esgoto de Várzea Grande.
Ela era citada na investigação da PM como “possível PM Capanga”.
Já o jornalista José Marcondes, que é dono de um site de notícias no estado, tinha o apelido de “Mumu” na investigação. Muvuca disputou a eleição em 2014 pelo PHS e teve o governador Pedro Taques (PSDB) e outros quatro candidatos como concorrentes.
https://www.youtube.com/watch?v=E4t7oZV0qT8
Ao G1, ele disse que irá ingressar com ação por danos morais contra o estado e contra o governador e contra o ex-secretário da Casa Civil, Paulo Taques, “por invadir a minha vida, dos meus familiares e das minhas fontes”.
“É um atentado não só contra o jornalismo, mas contra toda a sociedade. Me colocaram na situação de traficante. É um crime inominável e precisam pagar pelo que fizeram”, afirmou. Ele avalia que o telefone dele foi grampeado pelas notícias que ele divulga envolvendo o atual governo.
Em nota, o Sindicato dos Jornalistas de Mato Grosso (Sindjor-MT) repudiou o possível abuso de poder, colocando em risco o livre exercício do jornalismo. “Repudiamos toda e qualquer prática que limite o exercício do Jornalismo responsável e a liberdade de imprensa e que tente calar um dos principais canais de voz da sociedade, pressuposto da democracia”, diz.
Investigação
A Procuradoria Geral da República (PGR) apura se o governador tinha conhecimento dos grampos, assim como quando esse esquema de escutas clandestinas teve início e se ainda continua.
O ex-secretário de Segurança Pública, Mauro Zaque, disse ter entregue ao governador documentos que comprovavam a existência de “escritório clandestino de espionagem”, para que o caso fosse investigado. “Em outubro de 2015, levei essa documentação ao conhecimento do governador. Ele viu que tinha o envolvimento de pessoas muito próximas a ele, inclusive secretários”, afirmou.
No entanto, o governador negou ter recebido essa documentação. “Não recebi essa documentação do promotor Mauro Zaque”, pontuou. Afirmou que agora determinou ao atual secretário de Segurança do estado, Rogers Jarbas, que apure o caso.
Quanto ao protocolo, ele disse ter constatado que existe o mesmo número, mesma data, mesmo horário, mesmo código de barra, mas que se trata de outro assunto, estradas.
Fonte: G1