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Manifestantes protestam em Jerusalém contra o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, e pedem o fim da guerra em Gaza, em 19 de março de 2025 — Foto: Menahem Kahana / AFP

Crise em Israel: multidões protestam contra Netanyahu em meio à escalada da guerra

Críticos apontam que retomada dos ataques em Gaza compromete segurança dos reféns israelenses

Milhares de israelenses saíram às ruas de Jerusalém nesta quarta-feira (19) em protesto contra o governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. A mobilização ocorre após a decisão do premiê de demitir Ronen Bar, chefe da agência de segurança interna (Shin Bet), e diante da retomada dos ataques militares na Faixa de Gaza. Familiares de reféns ainda mantidos pelo Hamas no enclave palestino também participaram da manifestação, cobrando ações para o resgate dos cerca de 58 sequestrados.

O ato teve início em frente ao gabinete de Netanyahu e seguiu em direção à residência oficial do premiê. Muitos manifestantes afirmam que permanecerão acampados nos arredores do prédio nos próximos dias. Os protestos incluíram palavras de ordem acusando Netanyahu de ter “sangue nas mãos” e cartazes com frases como “todos somos reféns” e apelos aos Estados Unidos para que “salvem Israel de Netanyahu”.

A manifestação, considerada a maior dos últimos meses, foi organizada por grupos de oposição que veem na demissão de Bar uma decisão política. O movimento ocorre no momento em que o Shin Bet investiga supostos financiamentos do Catar a assessores próximos ao premiê, mesmo com o país árabe sendo um aliado do Hamas. Em meio aos protestos, alguns participantes carregavam bonecos de Netanyahu em gaiolas com a inscrição “Catargate”, em alusão às suspeitas de corrupção.

“Esperamos que toda a população de Israel se una a esse movimento até que a democracia seja restabelecida e os reféns sejam libertados”, afirmou Zeev Berar, de 68 anos, à agência AFP.

Críticas à condução da guerra

Os familiares dos reféns acusam Netanyahu de colocar em risco a vida dos sequestrados ao autorizar novos bombardeios sobre Gaza. Para eles, a retomada da ofensiva na terça-feira teria “sacrificado” os israelenses ainda mantidos pelo Hamas, com a possibilidade de que alguns tenham morrido sob os ataques.

Além disso, os manifestantes apontam que o governo tem utilizado o conflito para evitar críticas e concentrar poder. No último domingo, Netanyahu anunciou a destituição de Bar alegando falta de confiança no chefe do Shin Bet, especialmente devido às falhas na segurança que resultaram no ataque de 7 de outubro.

A tensão entre Netanyahu e a agência de segurança vinha crescendo nos meses anteriores, intensificada por uma proposta de reforma do Judiciário que gerou grandes protestos no país. A situação se agravou após a divulgação, em 4 de março, de um relatório interno que expôs falhas na transmissão de informações de inteligência que poderiam ter evitado o ataque do Hamas. O documento responsabiliza o governo e sugere que a política israelense de manter uma postura de contenção permitiu que o grupo palestino acumulasse armamento avançado.

Tentativas de enfraquecer instituições

A destituição de Ronen Bar ocorre em um momento de novas tentativas do governo de Netanyahu de alterar o equilíbrio de poder em Israel. Em menos de um mês, o gabinete do premiê já havia manifestado intenção de demitir a procuradora-geral de Israel, Gali Baharav-Miara. Além disso, sua coalizão no Parlamento retomou esforços para conceder aos políticos maior controle sobre a seleção de juízes da Suprema Corte.

Essas iniciativas reacendem as tensões sobre a chamada reforma judicial, que em 2023 levou a protestos massivos contra Netanyahu. O plano, suspenso após o ataque do Hamas, gerou forte polarização no país, com críticos afirmando que enfraqueceria os freios e contrapesos institucionais e aumentaria o poder do Executivo.

“O afastamento do chefe do Shin Bet não deve ser analisado de forma isolada”, afirmou Amichai Cohen, professor de direito e pesquisador do Instituto da Democracia de Israel, ao jornal The Times. “Isso faz parte de um movimento mais amplo para minar órgãos independentes e concentrar o poder no governo.”

Impactos políticos e futuros desafios

Analistas apontam que a disputa atual reflete uma questão maior sobre o futuro do Estado de Israel. O governo de Netanyahu é apoiado por partidos ultrarreligiosos e por defensores da ampliação do controle israelense sobre a Cisjordânia. Esses grupos, por anos, contestaram a independência do Judiciário, do Ministério Público e dos serviços de segurança, que em diferentes momentos restringiram privilégios desses setores ou impuseram limites à expansão dos assentamentos israelenses.

Netanyahu enfrenta ainda acusações de corrupção e está sendo julgado por supostos casos de fraude, quebra de confiança e recebimento indevido de benefícios, acusações que ele nega. Seus aliados afirmam que a limitação do poder do Judiciário e de outras instituições fortalece a democracia, ao permitir que o governo implemente sua agenda sem entraves burocráticos. Também argumentam que Ronen Bar deveria renunciar, pois o Shin Bet falhou em evitar o ataque do Hamas.

Já a oposição alerta que essas ações podem desestabilizar a democracia israelense e abrir espaço para um governo mais autoritário. Além disso, questionam por que Netanyahu ainda não assumiu sua parcela de responsabilidade pelo fracasso na defesa do país em 7 de outubro.

Com o aumento da insatisfação popular e o recrudescimento da guerra, a crise política em Israel se intensifica, e os protestos contra o governo devem se manter nos próximos dias.