Cisjordânia: entre o medo e a esperança, uma nova Gaza?
No horizonte do campo de refugiados de Jenin, na Cisjordânia, a tensão é palpável. Ambulâncias palestinas e veículos militares israelenses cruzam o cenário, enquanto alguns moradores observam à distância, e outros, exaustos, carregam seus pertences, buscando refúgio.
Ala’a Aboushi, residente próximo à entrada do campo, oferece café árabe aos jornalistas que acompanham a movimentação. Suas palavras carregam a apreensão de um futuro incerto: “Eles [Israel] acabaram com Gaza e agora vieram para a Cisjordânia se vingar de nós. Nós, civis, não sentimos nenhuma segurança aqui.”
Escalada da violência
Após a entrada em vigor de um cessar-fogo temporário e um acordo de libertação de reféns em 21 de janeiro de 2025, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, anunciou uma “operação militar significativa e em grande escala” contra militantes palestinos em Jenin, considerado um reduto.
A operação se expandiu para outras áreas, como Tulkarem, onde se encontram dois campos de refugiados, Nur Shams e o campo principal, ambos estabelecidos após a criação do Estado de Israel em 1948.
As Forças de Defesa Israelenses (IDF) intensificaram as operações “antiterrorismo” na Cisjordânia, que já eram frequentes, após o ataque terrorista do Hamas no sul de Israel em 7 de outubro de 2023.
Operação militar e temores
A recente operação das IDF incluiu ataques aéreos e incursões terrestres, resultando na destruição de infraestrutura e residências, além de expulsões em massa, mortes e prisões. A ação coincidiu com o período de transição presidencial nos Estados Unidos, com a iminência de um pronunciamento sobre os planos israelenses para a Cisjordânia, o que intensificou o temor da população de que o território ocupado se transforme em uma nova Faixa de Gaza.
O ministro da Defesa israelense, em 29 de janeiro, sinalizou uma possível mudança de postura, com o objetivo de “coibir os terroristas e destruir a infraestrutura do terror” em Jenin, e garantir que a área não volte a ser um foco de violência.

Estradas bloqueadas são obstáculos à vida de 3 milhões de residentes da Cisjordânia – Foto: Tania Krämer/DW
Impacto humanitário
Segundo a Organização das Nações Unidas, mais de 40 mil refugiados palestinos foram deslocados de seus acampamentos. Em Tulkarem, ao menos nove pessoas perderam a vida, incluindo uma mulher grávida e seu bebê.
Umm Mohammed, residente em Tulkarem, relata a escalada da violência: “Cada vez é mais forte do que a anterior. Estávamos todos chorando de medo e terror.” Após dias de terror, o exército israelense ordenou que ela, seus filhos e netos abandonassem sua casa.
A família agora vive em duas salas de um clube esportivo local, que acolhe os desabrigados. Doações de roupas e colchões se acumulam na entrada. Na televisão, acompanham as imagens de sua casa, da cidade e dos campos de refugiados de Tulkarem e Nur Shams. As crianças tentam acompanhar o currículo escolar online, já que a maioria das escolas da ONU está fechada.
A voz dos deslocados
O filho de Umm, Ahmed, questiona a alegação de que a operação visava apenas militantes: “Quando estou na minha casa, não me sinto seguro. Você vem, como soldado ocupante, e me expulsa. Com que direito? Tem alguém armado aqui?”. Ele, que se locomove em uma cadeira de rodas elétrica, não pôde deixar o campo sem ajuda, devido às estradas danificadas.
A destruição causada pelas IDF, que alegam ter como alvo “infraestruturas terroristas”, é comparada por muitos à devastação de Gaza após uma guerra.
A operação militar foi acompanhada por fechamentos e longas esperas em postos de controle, afetando a vida de mais de 3 milhões de palestinos na Cisjordânia. As Forças Armadas de Israel confirmaram a intensificação das inspeções nos postos de controle, uma medida que consideram necessária para garantir a segurança.
De volta a Tulkarem, Umm Mohammed acompanha as notícias diariamente, na esperança de retornar à sua casa. Ela se preocupa com seus animais de estimação, que ficaram para trás, sem saber quando a situação se normalizará.
A Cisjordânia, palco de mais um capítulo do conflito israelo-palestino, vive entre o medo e a esperança, com a população temendo que a escalada da violência a transforme em uma nova Gaza.
( Com Tania Krämer/DW )