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(Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)

Cerca de 40% das cidades do país gastam menos de R$ 1 em saúde por habitante por dia

O Brasil gasta em serviços e ações de saúde pública, por dia, cerca de R$ 3,83 com cada brasileiro, um valor aquém do necessário, segundo o CFM (Conselho Federal de Medicina). Considerando todos os municípios do país, 2.200 prefeituras (39,5% do total do país) gastaram, em 2019, menos de R$ 1 para cada habitante por dia.

O Conselho, junto com a ONG Contas Abertas, fez o levantamento de gastos das esferas federal, estadual e municipal no Brasil. As informações foram obtidas através do Siops (Sistema de Informações sobre Orçamento Público em Saúde) e são fruto de autodeclarações dos diferentes entes públicos.

O levantamento não busca apontar possíveis desvios do investimento mínimo legal na área, segundo o CFM -todos os entes devem destinar uma parte específica de sua receita para a saúde. O conselho diz que há, inclusive, muitos municípios que gastam mais do que o estipulado em lei.

A análise olhou para valores de 2008 (corrigidas pelo IPCA) até 2019. O primeiro ano da série observada apresenta o menor valor por pessoa/dia, R$ 3. O maior valor, R$ 3,89, ocorreu em 2014.

“Existe subfinanciamento em todas as esferas. Esse valor deveria ser muito maior para conseguir amenizar o sofrimento da população. Além disso, a gestão é fundamental para que ocorra realmente a assistência adequada”, afirma Hideraldo Luis Souza Cabeça, secretário do CFM.

Um dos pontos destacados pelo CFM é o crescimento total e percentual quase constante dos gastos municipais com saúde no espaço de tempo observado. Em 2019, tais os gastos representavam cerca de 31% do total das despesas com ações e serviços de saúde. A esfera estadual ficou responsável por cerca de 26% e a federal por 42%.

O crescimento do gasto municipal, porém, não se traduz automaticamente em melhores serviços de saúde para a população, afirma Donizetti Giamberardino Filho, vice-presidente do CFM, considerando que o financiamento é só um dos pilares a se levar em consideração.

“Quando analisamos o número, é mto provável que os municípios mais pobres, caso eles não estejam integrados [a uma rede mais complexa do SUS], o custo será mais alto, mesmo que seja insuficiente”, diz Giamberardino Filho.

Focando a análise nas 26 capitais dos estados, o levantamento encontrou um gasto média anual, em 2019, per capita, de R$ 490,72. A capital que mais gasta é Teresina, seguida por São Paulo. Do total, 18 capitais ficam abaixo da média nacional e 9 não chegam a gastar R$ 1 para cada habitante por dia.

Nos gastos estaduais per capita, o primeiro lugar é ocupado por Roraima, seguido por Tocantins.
Apesar de afirmar que os gastos são insuficientes, o CFM não aponta qual valor seria próximo do ideal. Observa, porém, outro parâmetro econômico para para embasar a afirmação: a fatia da participação pública nos gastos totais de saúde.

A comparação usada pelo CFM é proveniente de dados da OMS (Organização Mundial da Saúde).

Segundo o levantamento, o setor público brasileiro (União, estados e municípios) é responsável por cerca de 42% do gasto em saúde no Brasil. Enquanto isso, países com propostas de universalidade de saúde semelhante à brasileira, como Argentina, França, Canadá, Espanha e Reino Unido, têm participação pública de gasto superior a 70%, aponta o CFM.

“Aparentemente é muito dinheiro [o que o Brasil coloca em saúde], mas, para a nossa proposta de direito à saúde, esse financiamento é insuficiente”, afirma Giamberardino Filho.

O volume de verba inadequado chega nas pontas do atendimento, os médicos e a população.

Os profissionais são atingidos pela falta de estrutura e de políticas de carreira para retenção de pessoas nas unidades de atenção básica e em regiões interioranas. Segundo os representantes do CFM, isso acaba por fragilizar a “porta de entrada” do sistema de saúde, impactando o resto do sistema.

“Você sobrecarrega unidades que deveriam dar diagnósticos precoces e encaminhar para áreas de maior complexidade”, diz Cabeça.

Do lado do público, a falta de acesso a serviços pode ser visto como um dos principais resultados do gasto insuficiente (sempre lembrando que os representantes também destacam a importância de como o recurso é gerido).

“Em levantamento recente que fizemos, chegamos a encontrar uma pessoa no Ceará que estava há dez anos esperando para fazer uma cirurgia. É um absurdo”, diz Cabeça. “Uma senhora que tem câncer detectado não pode ficar seis meses esperando para tratar”, diz Giamberardino Filho.

Os representantes dizem que veem a necessidade de aumentar os recursos direcionados à saúde, além de melhorar a gestão dos mesmos. Defendem também avaliar a manutenção dos leitos que foram criados por causa da pandemia, o que poderia ajudar no atendimento da população.

 

 

Phillippe Watanabi Via FolhaPress